“Não sei se dou na cara dela ou bato em você
Mas eu não vim atrapalhar sua noite de prazer
E pra ajudar pagar a dama que lhe satisfaz
Toma aqui uns 50 reais
E por acaso esse motel
É o mesmo que me trouxe na lua de mel?
É o mesmo que você prometeu o céu?
E agora me tirou o chão”
Quem não conhece um dos mais recentes “hinos dos traídos”? A música “50 Reais”, de
Naiara Azevedo com participação da dupla Maiara e Maraísa, fala sobre um casal
flagrado pela esposa traída em um motel. Com letra cheia de simbolismo, as cantoras
narram como a mulher ofereceu cinquenta reais ― um galo, como denomina a gíria
dos cariocas ― para a amante do marido, como forma de deboche.
Galos, triângulos amorosos e traições flagradas, curiosamente, são elementos centrais
de um famoso mito grego sobre Afrodite, a deusa do amor e da feminilidade.
Afrodite era casada com Hefesto ― deus coxo da forja, da metalurgia, da técnica e dos
nós ― mas não era apaixonada por ele. Como narravam os gregos, a deficiência do
deus ferreiro dificultava as relações sexuais do casal e a deusa da fertilidade sempre
precisa ser fecundada. Fatalmente, Afrodite preferia a companhia do irmão viril do
marido: Ares, deus da guerra violenta.
A deusa do amor e o deus da guerra cultivavam um caso amoroso profundo. Sempre
que Hefesto se retirava para suas forjas no monte Etna, o casal encontrava-se no
palácio de Afrodite. Ficavam tranquilos, pois Alectríon, sentinela de confiança da
deusa, sempre os avisava quando o sol estava para nascer.
Certa vez, Alectríon caiu no sono. Quando Hélio ― o Sol ― que a tudo vê com seus
raios de luz, flagrou os amantes adormecidos, tratou logo de falar com o deus ferreiro.
Hefesto, para vingar-se, preparou uma rede mágica e prendeu o casal a seu leito em
uma posição desagradável, chamando todos os deuses do Olimpo para presenciar a
traição de Afrodite.
Ao verem-se livres, Ares e Afrodite fugiram. Ele, para a Trácia. Ela, para Chipre. Antes
disso, puniram devidamente o guardião Alectríon por seu erro. O jovem foi
metamorfoseado em galo (do grego alektryón) e condenado a avisar quando o nascer
do sol se aproximasse por toda a eternidade.
Um mito, por excelência, expõe o nascimento de uma realidade. Seus símbolos
sobrevivem por gerações, principalmente no que diz respeito aos mitos que servem de
base para o comportamento do homem ocidental. Com um único mito é possível, ao
mesmo tempo, explicar um comportamento “natural” e um “cultural”. Explica-se porque
o galo sempre canta ao começo de cada manhã, em igual medida que revela como
relacionamentos extraconjugais podem ser punidos e rechaçados pela sociedade. O
mito é tudo! É orientação, cosmologia, é chão e Norte para as ações do Homem, e
seus símbolos permanecem
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