“A gratidão é o bálsamo do coração”
 
Gurumayi  Chidvilasanda
 
Um mestre budista estava caminhando por uma ponte, quando viu um menino sentado perigosamente na borda e percebeu que ele estava em perigo. Sentou para conversar e convenceu-o a, antes de se matar,  escrever bilhetes que ele entregaria para cinco pessoas, as quais ele acreditasse serem merecedoras da sua gratidão por algo que tivessem feito por ele. Assim, elas não se sentiriam culpadas com esta escolha . Ao fazer isso, ele desistiu de pular.

A gratidão é algo tão intangível e difícil de se praticar, que supostamente se mudou para o ramo do esoterismo e não voltou mais, quando, na verdade, a gente devia falar dela na escola, estudá-la cientificamente e praticar na academia.

Imagino, assim, uma hora de abdômen e perna e dez minutinhos de gratidão. Posso imaginar as pessoas em frente ao espelho dando pulinhos e gritinhos de gratidão pela sua jornada. Sei que, para a maioria de nós, seria tão puxado quanto aquela meia hora de circuito pesado.

Com as eleições, quando vivemos uma guerra de ilusões nas redes sociais, dividindo-nos entre o “ninguém  solta a mão de ninguém” , e o “não solta o Lula da cadeia”, deixando-nos sem tradução diante do outro, ficou ainda mais difícil a tarefa de se desligar do “mal-estar na civilização” e ficar na “gratidão pela vida”.

Semana passada, eu vivi um momento desses de epifania, no qual você vive um segundo de “eureka!”, e entende tudo. O pai do meu filho me chamou para ir pegar outro bebê, assim da mesma forma que a gente fez o primeiro — sem planejar. Eu acordei de um sonho com uma ligação para ir buscar um cachorro com ele num canil em Vargem Grande. Achamos que indo  no contrafluxo seria rápido.

Tudo ia bem a não ser pelo aplicativo waze, que continuava nos mandando ir em frente numa rua de terra e lama, toda esburacada e cheia de poças da Pepa, como definiu meu filho. O carro acabou atolado num brejo.  Saltei do automóvel de sapato alto salto anabela, que afundou na lama enquanto ele tentava empurrar o veículo. Logo que saltei, notei duas capivaras me olhando e um cavalo passeando na frente do automóvel, que não saía do lugar. Nisso passou um carro com dois anjos simpáticos, ou seriam só duas pessoas boas mesmo, vindo do fim da rua — onde podíamos ver umas três casinhas cercadas por um riacho e um matagal —, avisando-nos para tomar cuidado com o jacaré e ficarmos dentro do carro. Eu já estava me sentindo em algum lugar fora do tempo sem isso.

Pedimos ajuda, os caras trouxeram uma madeira, uma corda, uma pá, mas foi inútil. Acabamos pegando uma carona para o começo da rua e achando o canil.  Adotamos nosso neném cão e achamos que valeu a viagem.  Mas ainda tínhamos que esperar o reboque.

Ali, no meio do nada, iluminados por uma lua providencial e pelo barulho de grilos,uma égua prenha veio na minha direção e parou para me olhar. Andei até ela com meu filho no colo. Apesar da Senhora, dona do canil, sugerir nao me aproximar de uma “egua de rua”, eu só sentia amor no olhar dela. Então,  estiquei a mão, ela olhou-me de banda, toquei na sua crina, toquei na barriga, fiz uma oração e senti uma imensa gratidão por estar ali, atolada, fugindo do jacaré, no meio do nada.

Naquele momento, entendi que a gratidão não acontece sendo pensada, racionalizada ou falada. Ela simplesmente acontece, é sentida nas fibras, é escorrida gota a gota do coração. A gratidão é o amor que a gente sente por nós mesmos, pelo universo e pela vida.


O mestre budista é o Daisaku Ikeda do Budismo de Nichiren Daioshin . A historia me foi narrada pela devota Luiza Sarmento do canal Causa Justa.

Gurmayi é a guru da linha milenar indiana Sidha Yoga.

Conheça mais sobre o trabalho de Patricia de Luna em : Youtube: Histórias Secretas

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