Todas nós temos um quê de Circe, Medéia, Perséfone, Calypso, Maga Patalógica, Elvira, e já explico o porquê…

Todas nós também temos um pouco da velha feiticeira encarquilhada com verruga na ponta do nariz e um pouco da sedutora tatuada de cabelos vermelhos e decote. E, claro que se você não tem esse perfil está achando que o texto não é para você, mas é…

Anos de Patriarcado – Ops! Um nome que eu não gosto por que ficou panfletário e esquecemos do que ele realmente trata: um sistema sócio-econômico-religioso (leia-se: religiosidade é diferente de espiritualidade) que tornou muitas características do feminino associadas ao feio.

Muitas características do feminino foram associadas ao feio

Assim sendo, a velha sábia virou uma mulher quase deformada e fedorenta; as idosas ( sábias) nunca são representadas de forma sensual, ou com a beleza que é devida a cada idade; a mulher que inicia, aquela que revela algo sobre o universo feminino, é uma força perigosa da natureza, como Baba Yaga que voa por aí e come criancinhas…

Há nisso uma propaganda subliminar: nunca olhe o horizonte , fique com o que te ensinamos, pois a iniciação será com um ser horrendo e o que seres feiosos poderiam te ensinar de bom ? Afinal só o belo é bom (?).

O belo foi associado ao bom, ao puro, ao divino. Mas não qualquer belo e sim um belo idealizado. E, então, voltamos as deusas negras e a pior das bruxas, as que são sedutoras. Por uma associação na Idade Média entre o arquétipo de Afrodite ( a deusa do amor e da beleza) e de Perséfone ( a feiticeira do submundo) comemos e bebemos de séculos de uma matrix que nos diz que ser sedutora é ser má e perigosa.

Existe uma Matrix que nos diz que ser sedutora é ser má e perigosa

Alguns dados interessantes, a maior parte das mulheres queimadas na Inquisição, não praticava nenhuma corrente de bruxaria, a causa mortis central era sexualidade, sedução. Mas, sabemos que a beleza está nos olhos de quem vê. Nesse caso, os olhos dos inquisidores…

Assim fomos queimando junto com as mulheres muitas características do feminino e ficamos só com as permitidas.

Pessoas boazinhas também se tornam Medéias quando são rejeitadas, porque é da natureza da mulher ser vingativa diante da rejeição. Podemos aceitar e integrar, ou podemos fingir que somos santas sem dualidade e enfiar nossas sombras por aí goela abaixo do outro, ou debaixo de algum tapete.

Assim fomos queimando junto com as mulheres muitas características do feminino e ficamos só com as permitidas

Mocinhas boazinhas também são capazes de exercer o poder magnético de Calypso. Dizem as más línguas que enquanto Ulysses ficava no meio da Ilha dela, esquecia de tudo relacionado ao seu propósito e seus sonhos e ficava feliz. Porém, quando se afastava para as margens e olhava o horizonte, começava a lembrar de partir…

Quem de nós não foi só uma jovem, como Core (Perséfone) antes de Hades e depois que passou por poucas e boas (leia-se inferno) levantou-se cheia do poder de si mesma, Rainha das suas sombras, confiante para disputar um Adônis com a gata da turma (Afrodite)?

Quantas de nós depois que passou poucas e boas, levantou-se cheia do poder de si mesma?

Saber-se bruxa é conhecer nossa natureza intuitiva, fascinante, sedutora, sensível, capaz de ler entre linhas e ver entre mundos; sentir-se parte com a magia da vida e da criação. Por outro lado, é ser capaz de ver nosso lado sombrio: seja enquanto força de ressurgir do inferno como a deusa Ishtar, ou o lado negativo da Maga Patalógica, aquela que quer usar seus talentos para roubar uma moeda do tio Patinhas.

Tornar-se bruxa é poder andar nas sombras do ser, isso nada tem a ver com religião, credo, educação. É apenas um tornar-se mais inteira em todos seus dons e aspectos do feminino e você pode fazer isso com qualquer credo e qualquer roupa.

Fotografia: Averie Woodard