Fim de ano com gostinho de fim de mundo, começou com Omicron e depois o Leonardo Di Caprio nos garantiu um fim de ano pensando na nossa transitoriedade. Para quem não sabe, a quantidade de filmes recentes sobre cometas deve-se a passagem do Apophis em 2030. O cometa já é uma estrela dos algoritmos na internet muito antes do “Não Olhe Para Cima”. São centenas de páginas de teorias da conspiração debatendo porque a NASA está recalculando a rota do cometa?!
Não Olhe Para Cima tem sabor de aviso, não exatamente da passagem de um Cometa, mas do quanto nos tornamos propícios a extinção enquanto sociedade. E se não podemos fazer nada com relação a um cometa, podemos fazer muito pelo nosso fracasso como civilização. Nos parágrafos abaixo vou citar alguns lançamentos de 2021 para refletirmos sobre nós mesmos.
Não Olhe Para Cima tem sabor de aviso, não exatamente da passagem de um Cometa, mas do quanto nos tornamos propícios a extinção enquanto sociedade
O filme de Di Caprio mostra bem os danos do pensamento binário, somos uma sociedade que se empobreceu subjetivamente e que emburreceu coletiva e assustadoramente. Apesar de todo acesso a informação que temos hoje, a maioria de nós entende o mundo de forma bem simples como sendo bom, ou mau; zero, ou um; esquerda, ou direita. Parece que realmente tomamos a pílula azul de Matrix e nos tornamos parte do programa, incapazes de nos repensarmos; refletirmos sobre nossa dualidade e a do nosso mundo; sobre a complexidade da nossa existência, ou sobre a falta de certezas absolutas. Incapazes de raciocínios complexos viramos pessoas facilmente manipuláveis.
Nossa subjetividade foi sequestrada por uma fábrica de ideias e quem controla as máquinas são os políticos, as empresas, a web, os movimentos sociais e a mídia que não está mais focada em fatos. Mesmo as minorias em suas lutas tão justas só podem reproduzir os pensamentos dos seus movimentos, não podem questioná-los, ou discutir pontos de vista.
Parece que realmente tomamos a pílula azul de Matrix e nos tornamos parte do programa
Como disse antes, a indústria do audiovisual tem nos retratado bem esse ano. Aliás, Matrix, o filme que questionava a percepção de realidade em 1999 representada por uma geração que viu nascer o Google, o facebook e a Napster, falhou dessa vez. Nos anos 90, o filme nos fez debater livre-arbítrio e muito mais. O filme atual conseguiu o feito de não dialogar com nada. Mesmo sendo lançado num momento que representa um divisor de águas tão transformador quanto o de 1999: estamos diante do lançamento do metaverso e a única coisa que o filme faz é enfileirar referencias. Aliás, essa é a marca dos nossos tempos, reproduzir pensamentos, não pensar sobre nada. Matrix cita o Coelho branco da Alice, mas em nenhum momento usa essa metáfora no filme de forma que cause algum impacto na ação, porque isso implicaria em sair da reprodução e repetição de ideias pura e simples.
Essa é a marca dos nossos tempos, reproduzir pensamentos, não pensar sobre nada
Outro sinal dos tempos é que enquanto estávamos trancados esperando a pandemia acabar, mataram o He-Man e agora a Heroína luta sozinha. Mataram James Bond também para que 007 fosse uma mulher e por mais que eu tenha amado a ideia de uma agente secreta da Rainha ser uma mulher preta, gostaria de viver num mundo em que a heroína luta lado a lado com o herói e que ambos têm o mesmo grau de importância naquele mundo. Sobretudo, gostaria que as heroínas fossem valorizadas pelas potências do feminino e não que fossem um homem de saia, isso sim seria revolucionário.
Estamos ficando muito adequados a extinção…
Durante a pandemia mataram o He-Man e agora a Heroína luta sozinha
Espero um mundo em que a heroína luta lado a lado com o herói e que ambos têm o mesmo grau de importância
Voltando ao filme “Não olhe Para Cima”, quando a discussão do cometa começa, as pessoas dividem sua análise rasa entre rótulos: comunistas e apoiadores dos trabalhos que o cometa vai gerar. Os cientistas não ficam fora da crítica , são representados por um saco de gatos que vão de Anestesistas à Astrônomos e respondem todas as suas perguntas por telefone, mas apenas repetindo mais do mesmo, ou do que já foi definido pela empresa que quer explorar o cometa. O filme mostra bem que vivemos numa bolha criada por algoritmos e enquanto o cometa se aproxima, as pessoas debatem de que lado você está do 0 ou do 1 . E os cientistas ? Bem, o prêmio Nobel apoia o lado errado, mostrando que conhecimento, ética e sabedoria nem sempre andam juntos.
” Não olhe pra cima ” Enquanto o cometa se aproxima, as pessoas debatem de que lado você está
Já o esperado And Just like That não foi um retrato dos nossos tempos . Uma série rasa, que não faz jus a revolução causada por Carrie Bradshaw, numa época em que mulheres tinham vergonha de sentarem sozinhas num restaurante, e que uma mulher com mais de trinta solteira era considerada uma perdedora; a forma como Carrie lidava com suas possibilidades tornaram-se um marco e um modelo para milhares de mulheres numa década de mudança de comportamento. A volta não podia ser num momento mais propício, as cinquentonas estão mostrando que há vida após a menopausa, resignificando costumes e crenças sobre envelhecimento, trabalho e estão expondo a sexualidade e tirando ela à força das raias do tabu . Uma Carrie insossa não deu conta de nada disso. Charlote falhou logo agora que estamos falando de maternidade real e abrindo o verbo sobre os desafios dos casamentos longos. Minha dica para quem quer ver um personagem em torno dos cinquenta pegando a vida pela crina e montando ela livremente, pegue a pipoca e se delicie com a melhor personagem de Emily em Paris, a maravilhosa Sylvie.
O esperado And Just like That NÃO foi um retrato dos nossos tempos
Espero que Ananke, a deusa da restrição, da necessidade e do destino, irmã do Tempo – Cronos, venha mudar o jogo. Afinal, as mudanças só acontecem pelo desejo, ou pela necessidade. Na cosmogonia Órfica ela era representada como uma serpente junto a Aeon, enrolados no ovo primordial, representando a criação do mundo e o início do Cosmos. Sem dúvida, estamos precisando de um reset. Eu espero que não seja pela violência, como através do choque de um cometa. Mas saibam que Ananke era adorada em Corinto junto a Bia, deusa da violência. Será que ainda há tempo para mudarmos com outros estímulos?
Meu desejo para 2022 é inspirado no filme que para mim foi o melhor lançamento da Disney: “The Beatles Get Back”. O que eu quero é uma revolução! Revolução do amor, da consciência, da inteligência, do bom gosto, da cultura, da educação! E esse é meu plano traduzido por John Lennon ipsis litteris, ele canalizou a solução anos atrás, fiquem com o profeta:
You say you want a revolution
Well, you know
We all want to change the world
You tell me that it’s evolution
Well, you know
We all want to change the world
But when you talk about destruction
Don’t you know that you can count me out (in)
Don’t you know it’s gonna be
All right?
Don’t you know it’s gonna be (all right)
Don’t you know it’s gonna be (all right)
You say you got a real solution
Well, you know
We’d all love to see the plan
You ask me for a contribution
Well, you know
We’re all doing what we can
But if you want money for people with minds that hate
All I can tell you is brother you have to wait
Don’t you know it’s gonna be (all right)
Don’t you know it’s gonna be (all right)
Simplesmente irretocável!!!! Pareceres incríveis , de uma pessoa inteligente que captou tudo …. ao pé da letra!
Assisti ontem . Quase desistindo de ir até o fim….. mas não costumo deixar nada sem terminar!
Parabéns Patrícia! Como foi bom lhe conhecer e lhe ouvir….
Um beijo e que venha 2022 com muitas mudanças!
Uauuuuu amei!!!!!!!!!! Parabéns!
Olá. Vê se gosta deste livro. Está esgotado e “cancelado” pelos poderes ocultos. https://drive.google.com/file/d/1KBSn5_aBvQua9Fp4-rtXQ25o7Q2qHffV/view?usp=drivesdk
Gostei muito de suas reflexões. Profundas e necessárias a um mundo tão previsível, chato, entediante e absurdamente medíocre. Parabéns pela clareza e suas interessantíssimas pontuações. Desejo que vc tenha muitos leitores que escutem interiormente suas importantes falas. Feliz Año de 2022, e com muitas inspirações.