O amor ditador não tem sexo, gênero, orientação sexual, classe nem raça. Não é exclusivo de ideologias e religião específicas, ainda que em um determinado contexto possam haver movimentos culturais mais danosos que outros e grupos desfavorecidos. Há religiosos que amam Deus e odeiam o ser humano, sem consciência disso, ou no mínimo, falam de forma que gera conflito. Existem ateus – mesmos aqueles intelectualizados – tão irracionais e fanáticos quanto os religiosos mais doentes. O amor ditador também aparece com frequência em práticas espirituais e éticas. Moralismo é moralismo!

É comum grande parte de nós encontrar uma bolha social e ideológica de zumbis, seja para liderarmos ou nos submetermos, e assim representarmos nossas neuroses e até doenças psicológicas mais graves em nome de algum “bem”. Assim, damos vazão à agressividade reprimida (no sentido psicanalítico) resultante de emoções que não tiveram representação verbal. Com efeito, ao compreendermos e utilizarmos a palavra “repressão” como sinônimo de “contenção”, podemos gerar graves sintomas individuais e sociais, relativos à falta de diferenciação entre “nos permitirmos sentir e falar o que estamos sentindo” e “agir”(geralmente atacando ou fugindo). É possível – mas nem sempre – sentirmos vontade de nos matar, falar sobre a vontade e não transformarmos em ato.

O amor ditador é um conjunto de sintomas psicológicos que podem ser graves – sobretudo por falhas no cuidado que recebemos quando bebês (pré-verbal) e crianças. Na maioria das pessoas, os sintomas não são considerados graves, mas sim neuróticos, causados por interdição da fala. É produto da cultura desenvolvida por nós, na qual TEMOS QUE sentir e existir de acordo com algum padrão, seja politicamente correto ou incorreto, com uma linguagem esvaziada de afeto em primeira pessoa (eu sinto), regada a muitas ordens “para o bem do próximo e da sociedade”. Quando damos ordens aumentamos a resistência de compreensão e reflexão sobre a ideia que estamos defendendo.

Muitas pessoas e grupos, seja por desonestidade intelectual (sintoma de caráter), ignorância e/ou distorção da realidade (neurose), manipulam fatos e dados para defender uma concepção, muitas vezes genuína e necessária ao debate. Nesse caso, representantes opostos geralmente com o intuito de contrariar apenas por crenças, conseguem demonstrar a incoerência do que há de importante na questão; um desperdício ao debate social.

Muitos de nós, conscientes ou não, transformamos desejo em ordem, utilizando palavras ditas “carinhosas”: “você tem que ir na festa hoje (emoji de coração)”, quando poderia ser “eu adoraria que você fosse”, “ficarei triste se você não for”. Sem necessariamente ter consciência disto, muitos vão por obrigação; outros inventam mentiras desnecessárias para não ir. Os sintomas psicológicos e físicos aparecem, quase nunca sabemos de onde vem. Costumamos produzir novos sintomas para fugir de sintomas. Isso não anula a realidade de que nosso desejo íntimo pode ser sobreposto por um desejo político e/ou profissional num determinado momento. Algumas vezes escolher mentir e/ou omitir é importante.

Freud demonstrou que a maior parte de nosso processamento mental é inconsciente e que descrever o que sentimos cura sintomas; o Psicanalista Mark Solms já mostrou dados científicos atuais que confirmam tal hipótese. Num geral, cismamos que podemos escolher o que sentimos. A natureza volta a galopes!

O Fato de já aprendermos a falar com uma estrutura linguística predominante – denominada pela técnica Loganálise como “linguagem executiva”, com ausência ou quase da “linguagem de reparação” – mantém muitos de nós fixados a momentos traumáticos da infância; quando uma emoção forte associada a uma memória é impedida de ganhar palavras por fatores externos, por nosso próprio pensamento e/ou forma de falar. O fato em si, “verdades e mentiras”, não é o mais relevante, mas sim o que foi sentido. É muito comum – logo normal – crianças no início da infância tentarem falar sobre medos que sentem, e escutarem: “você não precisa sentir medo”, ou algo do tipo. Seja de forma carinhosa (menos pior) ou agressiva, essa criança provavelmente terá sintomas; criará situações repetitivas ao longo da vida para ter contato com a emoção reprimida, até que ela seja representada em palavras.

A “linguagem executiva” tem a sua importância, damos e recebemos comandos específicos e necessários, sobretudo no âmbito profissional e em situações necessárias à rotina. Não nos parece funcional e apropriado contarmos nossos dramas ao garçom que está trabalhando num restaurante cheio quando ele pergunta como estamos hoje! Porém, desde bebês nossa cultura nos ensina apenas a linguagem executiva. Nossa mente, como qualquer máquina precisa de manutenção, que é realizada através da “linguagem de reparação”, quando falamos o que sentimos em primeira pessoa de forma específica: “EU me senti triste ontem quando você falou alto no jantar”, “Eu adorei a surpresa que você me fez ontem, estou sentindo tanto amor por você…” (Maiores informações no segundo link ao final)

Quando nos sentimos preocupados com alguém que gostamos, seria mais acolhedor, respeitoso e funcional para ambos dizermos: “Minha amiga, EU estou PREOCUPADO com você e SENTINDO medo dessa sua relação com esse cara, EU SINTO que ele te faz mal”, ou, “Amiga! VOCÊ TEM QUÊ esquecer esse cara! Ele te faz mal! Não vou deixar você encontra-lo mais! ?

Nos afastando de discussões sobre as intenções (o inferno está lotado de ótimas!), todo regime totalitário precisa extinguir o EU do sujeito, que passa a ter apenas uma identidade social, geralmente criada por um líder específico ou ideologia. A modificação do significado de certas palavras ao longo da história nos diz muita coisa. Razão (proporção, equilíbrio, ponderação) foi distorcida para sinônimo de intelecto e oposto de emoção. Assim, somos robôs ou impulsivos, ambos irracionais.

Durante o regime nazista, Hitler ordenou a primeira morte de um bebê induzida por drogas por ter nascido com cegueira e deficiências físicas: utilizou a palavra “Eutanásia” para o procedimento. Não precisa ser estudioso de etimologia para saber que este EU presume “escolha individual” por uma morte assistida devido a situações patológicas insuportáveis para o indivíduo. Se nos afastarmos um pouco do fato de quem foi o autor da façanha, ao menos alguns de nós perceberão que independente dos motivos, impedir que indivíduos existam e expressem a própria existência, desde que não interfiram nos direitos legais de outras pessoas, o mecanismo é idêntico. O autoritarismo varia em graus, consequências e roupagem.

Pessoas com grau de fobia (medo irracional) exacerbado (oriundo de repressão verbal) tem baixa capacidade de percepção específica e tendência a generalização. São incapazes de enxergar uma bondade ou coerência específica advindas daquilo que representa para si e seu grupo o mal ou a incoerência de forma generalizada, e vice e versa. O radicalismo relativo aos conceitos de “bem” e “mal” é constituído por situações inconscientemente criadas para representarmos emoções que não tiveram acesso a palavra. Assim, o amor ditador ganha forma, em nossas relações com nós mesmos, amigos, familiares, par romântico e com questões sociais.

Nossa fala parece ter relação com a respiração, que é pedra chave no estado emocional geral (sereno, ansioso, angustiado, depressivo). Quando falamos o que sentimos “desabafamos”, reduzimos ansiedade, ficamos mais “inspirados”, “ventilam” ideias criativas. Passamos da respiração curta e acelerada (sintoma clássico de ataques de pânico), para mais profundas e lentas.

Nenhum de nós será perfeitamente racional, sábio, saudável e detentor do total livre arbítrio: ideais são apenas referencias para nos aproximarmos ou afastarmos. A proposta do aprendizado de uma técnica de comunicação sofisticada não se opõe ao fato de sermos seres sociais, mas pelo contrário: podemos minimizar conflitos internos e interpessoais desnecessários, assim como viver a nossa natureza emocional e existencial.

No sentido psicanalítico, um Insight só ocorre quando uma memória/informação intelectual (cognitiva) aparece de forma repentina e carregada de emoções, e o mesmo, já é consequência de alguma modificação interna imperceptível para nós. Explicações e teorias que generalizam o ser humano, e dizem o que e como devemos sentir para alcançarmos ideais que acreditamos existir, são ilusões ideológicas e comerciais que geram sintomas.  Informações sobre o comportamento humano (média) têm relevância psicológica e social, desde que não prescindam a importância da MINHA atenção no que EU SINTO agora e fale sobre isso, sem TER QUE estar dentro da média. Aliás, normal (mais comum) não é sinônimo nem antônimo de saudável.

Este é um caminho sugerido com bases científicas para através da fala integrarmos emoção e intelecto (cognitivo) com harmonia, de acordo com ambiente e momento, e assim, idealmente façamos as escolhas mais funcionais possíveis (equilíbrio entre prazer e necessidade), para nós mesmos e sociedade. Ter a informação de que da importância da prática de exercícios, alimentação balanceada, não utilizar ou não exagerar no uso de drogas (lícitas e ilícitas), lazer, contato com nós mesmos, social, artes e natureza é fundamental. Porém, nossas escolhas são mediadas por nossa existência única e pelo estado emocional; mesmo quando nos comportamos como zumbis, já que sofremos consequências.

Aos que tiverem vontade de aprender a técnica loganalítica, independente do (s) objetivo (s), inicialmente o processo é consciente e requer um certo “treino”. Posteriormente automatiza, como andar de bicicleta. A Loganálise não se opõe ao atendimento psicológico clínico, inclusive também há aprofundamento técnico e teórico para psicólogos. A maioria das pessoas não são pacientes graves e podem se beneficiar de uma comunicação saudável no dia a dia.

Mais informações nos links abaixo, se quiser, entre em contato comigo via e-mail ou instagram.

 

– O Projeto Loganalítico (Comunicação verbal e saúde psicológica). Menos de uma página em inglês, facilmente traduzível no google. http://loganalisepro.blogspot.com/2017/05/the-loganalytic-project.html

– Loganálise e a cultura do bem estar https://loganalisepro.blogspot.com/search?q=cultura+do+bem+estar

– O que é a neurose e a necessidade do psicosanitarismo. http://loganalisepro.blogspot.com/2011/08/o-que-e-uma-neurose-e-necessidade-do.html

– Textos de Raphael Pita publicados na Vênus digital: https://www.venus.digital/author/raphael-pita/

– Livro: A Nova Conversa (Luis Cesar Ebraico – Criador da Loganálise) https://www.amazon.com.br/NOVA-CONVERSA-comunica%C3%A7%C3%A3o-cotidiana-repress%C3%B5es-ebook/dp/B00B4IHRNU

 

 


foto: Alex Martinez