Tua sedução é menos
de mulher do que de casa:
pois vem de como é por dentro
ou por detrás da fachada.
Mesmo quando ela possui
tua plácida elegância,
esse teu reboco claro,
riso franco de varandas,
uma casa não é nunca
só para ser contemplada;
melhor: somente por dentro
é possível contemplá-la.
Seduz pelo que é dentro,
ou será, quando se abra;
pelo que pode ser dentro
de suas paredes fechadas;
pelo que dentro fizeram
com seus vazios, com o nada;
pelos espaços de dentro,
não pelo que dentro guarda;
pelos espaços de dentro:
seus recintos, suas áreas,
organizando-se dentro
em corredores e salas,
os quais sugerindo ao homem
estâncias aconchegadas,
paredes bem revestidas
ou recessos bons de cavas,
exercem sobre esse homem
efeito igual ao que causas:
a vontade de corrê-la
por dentro, de visitá-la.
João Cabral de Melo Neto foi poeta, escritor e diplomata brasileiro. Conhecido como “poeta engenheiro”, ele fez parte da terceira geração modernista no Brasil, conhecida como Geração de 45.
Nesse momento, os escritores estavam mais preocupados com a palavra e a forma, sem deixar de lado a sensibilidade poética. De maneira racional e equilibrada, João Cabral se destacou por seu rigor estético.
“Morte e Vida Severina” foi, sem dúvida, a obra que o consagrou. Além disso, seus livros foram traduzidos para diversas línguas (alemão, espanhol, inglês, italiano, francês e holandês) e sua obra é conhecida em diversos países.
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