toda mulher é um deserto .
é domingo, demoro-me um pouco mais na cama. gosto de atravessar esse tempo assim
sem pressa e descoberta do lençol
as formas fronteiriças da manhã deitando-se sobre meu corpo .
quando me viro de bruços, a claridade encontra minhas costas, desde a nuca
conforme os minutos passam e o sol se ergue, ela desce, vértebra por vértebra; avança pelo sacro, pelas nádegas e coxas .
toda mulher amanhece terra devastada .
às nove e pouco, a a luz se alinha perfeitamente à janela. aí então me levanto e fecho a veneziana, voltando depois a me deitar, na mesma posição . (sou uma noite vestigiada pela promessa do ouro
sou aquela que está na cama
e que vive a vida trazendo dentro de si uma cidade lendária) .
estamos no fim do verão; e é domingo
e meus cabelos celebram o deserto de sentir tua falta
meus cabelos celebram este lugar onde me deito desértica e me torno a um só tempo
mulher
e miragem
Mar Marceli Andresa Becker (Marceli Andresa Becker) nasceu em Passo Fundo/RS e atualmente mora em São Paulo/SP. Formou-se em Filosofia/UPF e possui especialização em Epistemologia e Metafísica/UFFS. Participou de algumas antologias da poesia brasileira recente e tem duas plaquetes publicadas, uma pelo Centro Cultural São Paulo e outra pela Editora Quelônio (publicação em conjunto com os poetas Alberto Bresciani e Ana Estaregui, projeto Vozes Versos, curadoria de Heitor Ferraz Mello e Tarso de Melo.
A escrita de Mar Becker testemunha a marca de um corpo falante, um corpo onde reside um gozo feminino que foge do simbólico, e que permanece não nomeável. Essa dimensão da poética de Mar Becker se aproxima do mistério do corpo quando se lança na direção de visar o enigma de um gozo que não consegue dizer-se.
Fonte da Bio: Revista In Situ
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