Até o início da quarentena eu costumava ir ao Arpoador, quando estava por Ipanema no final da tarde, conversar com pessoas, turistas ou não, que aguardavam para se maravilhar e aplaudir o “Pôr do Sol”.

Chegava pouco antes daquele momento e puxava conversa com alguns grupos que lá aguardavam ansiosos, junto com centenas de pessoas ocupando a Pedra do Arpoador.

Começava dizendo: “Posso dar uma sugestão?”  As pessoas olhavam para aquele senhor de cabelos brancos e aceitavam dizendo: “Claro, diga lá!”  E eu dizia: “Vocês estão aqui para admirar e aplaudir o “Pôr do Sol”, entusiasmados com o movimento da natureza?”

Concordavam, rindo e curiosos.  E aí eu lhes propunha que olhassem o movimento de outra maneira.  Não era isso o que eles estavam assistindo.  A beleza era do “Giro da Terra”, no qual eles poderiam ver o movimento “Terra-Sol” como quem estivesse numa “roda-gigante” girando para trás.  Estaríamos vendo o nosso planeta vivo, percebendo a velocidade no giro da nossa casa cósmica, afastando-nos de continuar vendo o Sol, naquele dia. Eles se surpreendiam com a proposta, pensavam um pouco e acabavam comentando: “O senhor tem razão, é isso mesmo!  Vou olhar deste jeito real!”

Enquanto eles ficavam conversando surpresos, eu partia para outro grupo, e outro, e outro…

No final, depois dos aplausos ao espetáculo, muitos vinham me agradecer pela sugestão, e que iriam levar esta ideia para suas cidades, era para ver o seu planeta vivo, movendo-se.

Agora, neste período de quarentena, quieto aqui em casa e com tempo, decidi falar sobre algumas ideias correlatas ao equívoco do “pôr do sol”, tão constante e despercebido mundo afora.

Embora o cientista/astrônomo Galileu Galilei tenha comprovado há mais de três séculos a esfericidade da Terra – a 3 ª dimensão do espaço – e o seu movimento em torno do Sol e de si mesma, foi difícil e parece ser até hoje, a aceitação imediata das descobertas da Ciência.

Galileu quase foi parar na fogueira, teve que se desdizer e só foi absolvido, corajosa e humildemente, pelo Papa João Paulo II, recentemente, em 1992.

Outras descobertas importantíssimas da Ciência, bem mais recentes, até hoje também não foram percebidas, na sua potente inovação: a descoberta do Átomo e a Teoria da Relatividade.  Ambas as conquistas científicas, no início do século XX, levam-nos ao conhecimento de algo inesperado.

A Teoria Quântica nos informa que somos constituídos de “partícula e onda”, as partículas elementares.  Em uma causação ascendente (como indica o conceituado físico Amit Goswami – “O Ativista Quântico”) das partículas elementares surgem os átomos, destes as moléculas, das moléculas às células (inclusive os neurônios) daí ao cérebro, do cérebro à consciência.

Partícula e onda.  Somos, simultaneamente, algo material e algo imaterial, cientificamente comprovado.  Partícula e onda.   Matéria e energia.

Corpo e Espírito? Cérebro e mente?  Consciência?

Outra descoberta científica: a partir de 1905.  Na Teoria da Relatividade, Einstein informa da 4 ª dimensão do espaço – Tempo.

Às 3 dimensões iniciais de conhecimento do espaço: linha, área (a Terra plana) e volume (a Terra esfera).  Agora acrescenta-se Tempo – a primeira das dimensões espaciais totalmente imaterial.

O conhecimento científico atual leva-nos a saber que não só nós mesmos, também o espaço onde vivemos, penetra um campo superior, além dos níveis materiais.

Alguns filósofos e cientistas, e entre eles, o francês Edgard Morin informa que não há solução possível para livrar o mundo desta situação auto destrutiva e inarredável em que nos encontramos.  Sugere manter a esperança e contar com algo “ IMPROVÁVEL” que possa acontecer, sacudindo as cabeças dos humanos, mudando radicalmente nosso comportamento em relação à nossa vida entre nós mesmos e o planeta.

Quem sabe estamos vivendo este momento?  Pela primeira vez estamos acometidos por uma pandemia atingindo a Terra toda, todas as nações ao mesmo tempo, das capitais e grandes cidades ao interior dos países, isolados nas habitações – e ao mesmo tempo intercomunicando-nos uns com outros pelo planeta todo através de uma tecnologia nunca antes existente.

É a chance de adquirirmos uma consciência planetária, percebermos a importância do comportamento ecológico na preservação da vida na Terra e o respeito por todos os terrestres, corrigindo o abismo social decorrente desta vida extremamente materialista que levamos.

Este isolamento quase pessoal e ao mesmo tempo comunicação global produziu uma situação exemplar: a vigorosa manifestação mundial contra o racismo, a partir do fato de as pessoas, em todo o planeta, terem assistido ao covarde e brutal assassinato de George Floyd, um cidadão negro, por um policial branco nos EUA.  A cena da extrema maldade, lentamente executada, impactou fortemente a todos.  Aquela atitude racista, absurda, injusta, cruel espalhou manifestações de repúdio veementes por muitos países.

Esta oportunidade de isolamento familiar e junto com o contato mundial entre os povos, pode dar início a uma profunda mudança de paradigma de comportamento social e psicológico em todo o planeta, neste já histórico 2020.

Estará presente o “IMPROVÁVEL”, transformando completamente o caminho da humanidade?

É um tempo de pensarmos em conjunto, superando divergências, buscando entender-nos em um plano superior ao que temos vivido até agora, entre a Terra e os terrestres.

Viver conscientemente o que nos aponta a própria ciência.  Agora depende de todos.  Ela já propiciou a importante compreensão de que somos existentes além da matéria, mas parece que também não percebemos.

Algo em nós mesmos além de nós.

Muitos jovens já entraram nesta sintonia.  E eles, além de energia, dispõem de tempo necessário.

Matéria  e  Energia.  Espaço.  Tempo.

 

Mauro Halfeld dos Guaranys é arquiteto, artista plástico e professor universitário (USU). Realizou projetos em vários estados brasileiros para o Serviço Social da Indústria (SESI). Tendo como alvo os trabalhadores, arquitetou espaços para educação, saúde, esportes, lazer e arte. Além disso, dedica-se a uma arquitetura social em comunidades do Rio de Janeiro, atuando no projeto de urbanização da Rocinha, entre outras. Como arquiteto projetou residências, pousadas e colégios, incluindo a parte nova do Colégio São Bento (RJ) , em área tombada pelo SPHAN, premio de arquitetura do IAB em exposição no MAM (Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro).  Como artista visual tem exposto em galerias e centros culturais. Tanto na sua arte como em seus textos, Mauro dos Guaranys procura expor diversas formas de olhar e perceber o mundo e a sociedade nos quais estamos inseridos, sugerindo reflexões para ampliarmos nossos campos de visão e perspectivas.

foto: Guide Rio