Eles eram mais antigos que o silêncio

A perscrutar-se intimamente os sonhos

Tal como duas súbitas estátuas

Em que apenas o olhar restasse humano.

Qualquer toque, por certo, desfaria

Os seus corpos sem tempo em pura cinza.

Remontavam às origens – a realidade

Neles se fez, de substância, imagem.

Dela a face era fria, a que o desejo

Como um hictus, houvesse adormecido

Dele apenas restava o eterno grito

Da espécie – tudo mais tinha morrido.

Caíam lentamente na voragem

Como duas estrelas que gravitam

Juntas para, depois, num grande abraço

Rolarem pelo espaço e se perderem

Transformadas no magma incandescente

Que milênios mais tarde explode em amor

E da matéria reproduz o tempo

Nas galáxias da vida no infinito.

 

Eles eram mais antigos que o silêncio…


Vinicius de Moraes, nascido Marcus Vinicius de Moraes foi um poeta, dramaturgo, jornalista, diplomata, cantor e compositor brasileiro.
Poeta essencialmente lírico, o que lhe renderia a alcunha “poetinha”,que lhe teria atribuído Tom Jobim, notabilizou-se pelos seus sonetos. Conhecido como um boêmio inveterado, fumante e apreciador do uísque, era também conhecido por ser um grande conquistador. 
Sua obra é vasta, passando pela literatura, teatro, cinema e música. Ainda assim, sempre considerou que a poesia foi sua primeira e maior vocação, e que toda sua atividade artística deriva do fato de ser poeta[7]. No campo musical, o poetinha teve como principais parceiros Tom Jobim, Toquinho, Baden Powell, João Gilberto, Chico Buarque e Carlos Lyra.

Foto Louis Amal