No peito um jardim
de flores pútidras
pulsava
cultivado
à base de crueldade
cada ato presenciado
fazia florescer mais
um botão
ela às vezes desejava
que fossem outros tipos
de botão
que houvesse um que ela
pudesse apertar
e reiniciar
seu peito
sua vida
estava cansada
de sentir tanto
de se irritar tanto
de odiar tanto
mas esse mesmo cansaço
era o que a fazia
odiar ainda mais
assim seguia
regando
raiva com desprezo
descaso com ressentimento
envenenando
todos aqueles que
tentavam ajudar
até o dia em que
encontrou alguém
que não tentou ajudar
alguém que ignorou as flores
mortas
e resolveu passear pelo jardim
do seu peito
alguém que não fugiu do cheiro
fétido
e pisou
e destruiu
todas as flores
de sangue coagulado
que conseguiu encontrar
alguém que
segurou e
apertou
o último botão do ódio
e deixou em seu lugar
composto orgânico suficiente
para fazer nascer
– clichê inevitável –
amor

Carina Destempero

Foto CVATIK