Foto Casey Horner

Como este tempo vai marcar a nossa história?

Esse não é o último texto de autoajuda, é uma reflexão sobre o que mais importa em qualquer crise, de qualquer tempo: Quem seremos durante esse processo, por que isso vai marcar nossa história?

Na primeira semana, reparei tudo que me incomodou. Vi pessoas brigando nos grupos por suas opiniões, gente que enviava todo dia as notícias mais avassaladoras e tenebrosas que encontrasse, sendo capaz de espalhar mais medo do que informações importantes, mas fiquei principalmente incomodada com o egoísta do mercado. Falo daquele que anda assaltando as prateleiras das farmácias e levando todo álcool, máscaras e luvas como se fosse o suficiente se proteger sozinho. Pensei em escrever para Deus, e não para esta coluna: “ Deus não aguento mais a humanidade, acho que você mandou o meteoro. ”

Na segunda semana, comecei a me perguntar: Teremos aprendido as lições quando acabar essa crise? Será que Veneza vai limitar o número de transatlânticos por mês para manter suas águas límpidas? Será que os países vão repensar junto à grandes empresas como proteger melhor o meio ambiente? Será que os chineses terão se afeiçoado ao ar mais puro e assinarão o tratado de Paris? Ou não? Então, escrevi para um amigo astrólogo e não deu para escrever a coluna.

Em algum momento entre a primeira e a segunda semana, comecei a filosofar quando recebi um texto de autoria da antropóloga Margaret Mead, que calou fundo na minha alma. Ela afirmava que o primeiro sinal de civilização seria um fêmur quebrado e consertado, porque para alguém se recuperar, outros teriam que ter ajudado. Sendo assim, ela concluía: “ajudar alguém durante a dificuldade é onde a civilização começa. ”

Neste fim de semana, percebi que estamos de castigo, no cantinho do pensamento, mas não estamos sozinhos realmente. Pela primeira vez na minha vida, vejo a maior parte do mundo fazendo a mesma coisa ao mesmo tempo. Acompanho terapeutas, lideranças, escritores e amigos dos quatro cantos pelas redes sociais e estão todos postando sobre os mesmos temas: como dar conta do “home school”, da solidão, do casamento em confinamento, da dieta, do exercício, do medo, da solidão e etc. Estamos todos no mesmo barco!

De repente, eu, Oprah (EUA) e Danielle Steel (Paris) estamos vivendo o mesmo problema e a humanidade jogou na nossa cara, que o endereço e a conta bancaria não mudam o fato de sermos humanos e sendo assim, constituídos em carne e osso desde o ventre até a morte, somos mais fortes no espirito do que na carne. Nesse momento, já tinha esquecido a lista de reclamações da primeira semana e só queria agradecer por descobrir finalmente o significado daquele mantra esquisotérico: somos todos um.

Finalmente, eu estava pronta para escrever para essa coluna, o que é difícil por que meu filho me interrompe com seu boneco do Buzz Lightyear, pedindo que eu exerça minhas novas funções de babá, benzedeira, cozinheira, faxineira, animadora do parquinho e professora.

Lutei todos os dias contra o sono e a falta de tempo para terminar este texto e senti inveja dos solteiros meditando em transmissões diretas com monges no Tibet, ou com a Guru diretamente da índia, colocando a leitura em dia, rezando com o Papa sem ter que passar pano, olhar o fogão, montar quebra-cabeça e dar olhadinhas na TV entre uma coisa e outra.

Até que percebi que talvez a coluna atrase, a casa não fique tão limpa, a dieta fique para 2021, mas eu estou exatamente onde precisava estar, aprendendo exatamente o que preciso aprender.

Levanto do computador mais uma vez, corro com meu filho para varanda e grito feliz o lema do herói de brinquedo: Ao infinito e avante.

Como todo mundo no confinamento, tenho tido momentos tensos, insanos, e outros transformadores e lindos, mas como escritora e contadora de histórias, gostaria de compartilhar uma história que tem me mantido forte em todos eles.

Eu pratico uma corrente filosófica indiana, não é uma religião, e membros de diversas correntes religiosas praticam esse caminho. Durante 8 anos, fui a coordenadora de um dos cantos para meditação. De repente, o canto e a meditação esvaziaram, até que ninguém mais vinha…

Eu continuei cumprindo minha função e não me sentia só, por que imaginava que de alguma forma eu estava contribuindo para a casa, para as pessoas que frequentavam outros eventos e que no seu tempo a sala encheria de novo se eu fizesse meu papel. Então, quando estava ali sozinha, eu estava com todos os frequentadores.

Depois de um tempo, comecei a achar que era viagem minha e marquei hora com a coordenação da casa para encerrar o canto. No dia marcado, ela me abraçou muito emocionada, disse que vinha sonhando comigo e que sempre no sonho ela tinha que me dizer a mesma coisa: quando estamos sozinhos, estamos com Deus.

Acho que hoje todos nós estamos lendo, cantando, cozinhando, dançando sozinhos na sala, ou apenas com os nossos familiares. Mas, quando temos consciência de que ali, nos isolando pelo bem comum, estamos fazendo algo por todos, somos uma civilização.

Desejo que cada um esteja com o que lhe é sagrado.  O Tao, o Todo, Jesus, Axé, as forças da Paz, o Amor, a Família, mas, sobretudo, que quando viermos a sair dessa sala vazia, sejamos capazes de ter sido transformados.

Finalmente, terminei a coluna que bem poderia ser a carta que queria escrever para Deus no começo do confinamento, só que agora eu diria, obrigada pela humanidade que nos mostra que o que temos de melhor transcende tudo que temos.

PS.: Terra, vamos voltar logo, você deve estar se sentindo sozinha, espero que tenhamos aprendido a tratar tudo e todos melhor até lá.