Christovam de Chevalier celebra 20 anos de carreira literária com livro no qual usa do mar para falar de amor, expõe também sua luta com o poema e louva seus parceiros na arte

“A poesia de Christovam de Chevalier tem, a meu ver, dois traços particularmente marcantes: a economia vocabular e a metáfora inesperada”  Ferreira Gullar (1930-2016)

Christovam de Chevalier costuma dizer que, na sua casa, vivem o jornalista e o poeta. “O primeiro é quem paga as contas, mas tenho fé de que, algum dia, ambos vão dividir as despesas”, completa ele com bom humor. O trabalho do poeta completa, este ano, duas décadas de perseverança. E a data é celebrada com o lançamento de “Marulhos, outros barulhos e alguns silêncios” (7 Letras), terceiro livro do escritor. A obra é dividida em três partes. A primeira, “Marulhos”, traz 18 poemas nos quais o mar é a metáfora de um amor que cumpriu seu ciclo – e que inspirou exposição homônima, exibida pelo Oi Futuro no início do ano. As outras partes são “Poema grito”, inspirado pela própria relação do autor com sua escrita, e “Cantares de amor às pessoas do meu tempo”, no qual canta amores findos e saúda artistas que perseveram no seu ofício criador. A orelha da obra é assinada pela crítica e curadora de arte Claudia Ahimsa, que chama a atenção para a qualidade da coletânea: “E impressiona o seu phatos, seu mundo reconstruído (…) assim como o aspecto formal estruturado, o metro, a rima, a sintaxe na linha do irretocável”.

O livro é aberto com “O momento presente (Motivo remix)”, espécie de prólogo no qual o autor leva à poesia a questão da ideologia de gênero. E inicia seu discurso evocando a figura de Cecília Meireles (1901-1964) – que quebrou o paradigma de a mulher ser tratada como poetisa. Mais exatamente o ponto de partida é o poema “Motivo”, da autora (daí o subtítulo do poema). “A poeta nos disse cantar porque existe/o instante e que sua vida estava completa/ E não importa, com sua licença, o que insiste/ em sermos agora. Se homem, mulher ou poeta”, provoca ele.

O leitor mergulha, em seguida, no primeiro dos livros que compõem a coletânea: “Marulhos”. Nessa obra, composta por 18 poemas, o mar é o pano de fundo (ou seria a personagem principal?) para o poeta falar de um amor, da euforia do encontro ao luto provocado por seu ocaso. “Um homem entregue à pena do mar/ ao degredo do mar/ ao indulto do mar/ Meu crime?/ Amá-lo acima dos homens”, entrega ele lançando-se no terreno do mar/amor. E como em toda aventura, há o fim – provocado pela partida do outro: “O marinheiro foi-se/sem deixar pistas de seu destino/ Foi-se como a vida esvai-se/ sem fazer (ou ter) nenhum sentido”.

“Poema grito” é a segunda parte da coletânea. Ela é também composta por 18 poemas, todos sem título, que podem ser lidos cada um individualmente ou formarem um longo e único poema. Nessa parte, o autor expõe sua luta/labuta com a escrita, com algo que é um lampejo daquilo que, quem sabe, pode vir a ser um poema: “Poema-grito que reverbere pelas paredes/ricocheteie nos edifícios/adentre apartamentos/ ensurdeça cada cidadão”.

Em “Cantares de amor às pessoas do meu tempo”, terceira e última parte do livro, o poeta joga luz sobre efemérides de sua vida – e nas de artistas aos quais está ligado. E essas efemérides abarcam desde o fim de mais uma relação amorosa (“Tuas ausências, tuas mentiras/o vazio que era você agora é imenso/ O que encontro de melhor em mim/ é algo que não te confesso) até celebrações, como as que inspiraram os poemas dedicados às cantoras Fhernanda Fernandes (“A propósito de um cantora”) e Laura Finocchiaro (“A artista e seu ofício”), em razão de terem completado, respectivamente, 35 e 30 anos de carreira.

Christovam de Chevalier é, aos 43 anos, apontado por nomes consagrados da literatura como o maior poeta da sua geração. E esses “Marulhos, outros barulhos e alguns silêncios” têm tudo para corroborar isso. É como diz Claudia Ahimsa sobre o novo livro do autor: “o conteúdo libertário, de alma ‘bravia feito o mar’, em versos de alta precisão. Navegar é preciso”.

Mais sobre o autor:

Christovam de Chevalier é autor de “Um livro sem título” (7Letras, 1998) e “No escuro da noite em claro (7 Letras, 2016). Tem também poemas publicados nas revistas “Rua”, da Unicamp, e da Biblioteca Nacional, além da coletânea “Agora como nunca”, organizada por Andriana Calcanhotto e editada no Brasil (Cia das Letras, 2017) e em Portugal (Cotovia).


 contato: christovam.chevalier@gmail.com