Amor e dor até rimam, e sabemos que muitas vezes caminham juntos ou estão intimamente ligados. O bônus de amar é prazer, paixão, tesão, cumplicidade, parceria, amizade, entre outras coisas, mas também tem o ônus que vem no término, quando a decisão é unilateral. E nessa hora a dor é inevitável. “O mundo muda, estremece, o caos acontece, não poupa ninguém”. Da mesma forma que chega desconcertante, acaba dilacerante. E quem nunca sofreu por amor? Experiências emocionalmente dolorosas sobrevivem mais tempo na memória do que a dor física, afirmaram psicólogos americanos em estudo na Universidade de Purdue, em Indiana. Para a psicóloga Patrícia Costa, não há farmácia que venda uma pílula para curar a dor de luto, abandono, saudade, traição, frustração e de todos os desejos que não se concretizam. O trauma da separação, dependendo do caso, muitas vezes permanece por anos carimbado no nosso sistema.

Foto: Edu Lauton

“Ficamos plugados nesta dor emocional, que é manifestada no corpo, e por dores em locais diversos, como o plexo solar, as costas, os ombros, o estômago. Muitas pessoas descrevem este sintoma como “dor na alma”, como se tudo estivesse doendo. Consequentemente há uma desconexão com o prazer. A dor emocional precisa de acolhimento e um entendimento maior e mais amplo, seguido de aceitação, perdão e deixar ir, virar a página” esclarece Patrícia.

A arquiteta Flavia Santos já sofreu muito por amor e confessa que, apesar de muito dolorido, nunca deixou de se entregar a um novo romance. “A dor do fim é insuportável, é um vazio enorme, um buraco sem fundo e sem agarras, mas acaba e, por sorte, nunca me traumatizou. Sofro, fico de luto, perco a fome e emagreço!”. E continua: “Hoje falo rindo, mas, no momento, parece que a aflição não terá fim e, após muitas experiências difíceis, sei que passa.”

Flavia vivia um casamento de cinco anos, possuíam uma casa linda e decorada pelo casal, trabalhavam juntos e, como ela não queria ser mãe, tinham três cães Golden Retrivers e dois gatos, saíam para dançar e se divertir, sempre recebiam amigos, vida perfeita como comercial de margarina. Até o dia em que amanheceu, ela desceu para o escritório, que ficava no primeiro andar da casa, e seu amor, sem briga, sem estresse e sem motivo aparentemente real, terminou a relação. “Fiquei louca, desorientada, não entendi. Não brigamos, não tivemos nenhum problema, nada! Ele simplesmente acabou com tudo. E tudo significava abrir mão daquele amor, ficar longe dos meus filhos de quatro patas, sair da casa dele, que eu havia decorado com o meu jeito, e ter que trabalhar diariamente com ele! Isso era o pior, pois o luto foi compartilhado e ele, muito meu amigo, me dava colo para o rasgo que tinha feito no meu peito”, relembra Flavia, que perdeu quase dez quilos, mas após seis meses solteira no Rio de Janeiro já estava novamente namorando e completamente apaixonada. Vida que segue, sem traumas.

Quando perguntado se já sofreu por amor, Caesar Barbosa, guitarrista da banda Cidade Negra confessa categoricamente que “Sim! Várias vezes! Quem nunca? Quem não ama, não sofre. Quem não vive, não sofre. Quem não se entrega, não vive!”, e dá uma aula dos aprendizados, com suas dores de cotovelo: “O sofrimento é inevitável. Houve rompimentos em que emagreci, pois não conseguia comer nem beber água. Em outros, eu comia normalmente, mas ficava meses sem saber o que era dormir uma noite inteira. Também nunca implorei a volta, porque quem quer… QUER!  Não se pode perder tempo com indecisões ou ‘joguinhos’.

O amor é para ser vivido e curtido. Se não tem essa vibe, esqueça! Parta para outra ou fique sozinho, se amando,” diz Caesar.

Para esse músico sensível, todo fim é um recomeço e seus rompimentos o deixaram mais maduro e cauteloso e com traumas apenas nos primeiros meses. “Lembro que uma vez troquei todo meu guarda roupas e não quis nada que lembrasse a ex. Eu simplesmente renovei e reconstruí tudo novamente e isso foi uma das atitudes que me fizeram levantar e ficar mais forte. Sempre levei grandes aprendizados e tirei proveito do caos que é o fim de um relacionamento“, relata o guitarrista. Caesar usou sua dor para se olhar, perceber como sentia as coisas, avaliar situações, se enxergar, se valorizar e fazer o que realmente o completava e enchia de prazer. Trabalhava sem descanso, lia, escrevia poemas e saía para festas e encontros, quando estava bem. Para ele, se fizemos tudo certo num relacionamento e não vacilamos com a pessoa que amamos, os únicos itens que precisamos curar é a falta da pessoa e as feridas deixadas. O melhor remédio para isso tudo é o tempo. E se ocupar com coisas saudáveis. Crie coisas, malhe, se alimente bem, mude de visual, compre roupas novas, ouça músicas que te tragam boas energias. Se ame! Olhe para o espelho e diga: “Eu me amo!”, esclarece esse último romântico. E finaliza, explanando: “Se você está vivendo algo assim, liberte-se do medo, pois muitas vezes abrir a porta da gaiola faz com que você veja paisagens nunca antes vistas.

Para a poetisa, filósofa, psicóloga e psicanalista Viviane Mosé, é o sofrimento que nos move.

“Não devemos buscá-lo, mas não temos que acabar com ele. Não somos nós que abolimos o sofrimento, é ele que acaba. É um processo de maturação no seu corpo. Ele se elabora e termina. É nesse rastro que rasga a alma e ela se torna mais ampla, maior e amadurece para a vida. É uma condição humana. Como nos Trabalhos de Hércules, um humano que se tornou Deus na mitologia Grega, pois diante de uma dor enorme com a perda dos filhos, foi capaz de empreender forças nas tarefas mais difíceis.”

Viviane Mosé ainda explica que, “ao invés de dar piti e se acabar com a dor, devemos enfrentá-la, vivenciá-la e suportá-la.” Que porcaria de ser humano é esse que não aguenta sofrer?! Se entope de remédios, sai para fazer compras e acha que assim acabará com a dor. Somos frutos de uma sociedade infantilizada, que não busca crescer com as perdas e obstáculos. O melhor a fazer é usar essa energia acumulada com coisas produtivas: arte, música, dança. É importante entender que a alma se reconstrói melhor, maior, e nessa amplitude cabe mais mundo, mais contradições e nos tornamos melhores e mais maduros à medida em que o tempo passa”, define Viviane. E conclui explicando que a nossa capacidade de alargar a alma torna nossa vida melhor e esse é o grande objetivo do sofrimento. Como tudo na vida tem jeito, para sair da sofrência, antes de qualquer coisa, a gente tem que decidir mesmo!

A dor é corporal, sim, porque já se sabe que a dor emocional é processada na mesma área do cérebro que dores físicas. Então, a pessoa tem que ser bem honesta com ela mesma e decidir virar a página. A psicóloga Patrícia Costa comenta: “Fazer a pessoa querer “largar aquele osso” é desafiador. E isso significa colocá-la frente ao desconhecido, o que normalmente assusta, e é por isso que muitas pessoas ficam em relações doentias e não saudáveis, porque aquele terreno é familiar, o que torna a melhor opção para alguns”. Mas Patrícia esclarece que tem jeito de sair da fossa. Pra começar é parar de vasculhar o Facebook do ex, não ouvir as “músicas do casal” ou qualquer dessas canções da moda sofrência, pois essas atitudes são os gatilhos que só reforçam a dor. “Posso garantir que conseguimos, sim, treinar nosso cérebro a perceber diferente. Dar novos significados e, como consequência, ter novas experiências. Então, da mesma forma que treinamos e ganhamos massa muscular com estímulos na academia, treinar o cérebro a ter conhecimentos diferentes é possível, mas necessita foco, empenho e autopercepção. E os cientistas afirmam: “O cérebro adora aprender coisas novas!”. Paralelo a isso, o que eu considero fundamental é o resgate do poder pessoal e do amor próprio. Uma grande oportunidade de reencontro. “Depois de um momento de dor emocional, a pessoa consegue sair muito melhor”, esclarece a psicóloga. Então, não há nada melhor do que levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima, pois como cantou Vinícius de Moraes: “Pra que chorar, pra que sofrer, se há sempre um novo amor, em cada novo amanhecer?”.